As eleições municipais estão próximas. Com elas, crescem aqueles(as) que prometem mudanças significativas em troca do voto de cidadãos e cidadãs. Para muitas pessoas, o período eleitoral se tornou menos um importante exercício da vida democrática e mais uma escolha compulsória entre o ruim e o menos pior. Entre os(as) jovens brasileiros(as) esta realidade não é muito distinta. Está cada vez mais difícil resgatar a fé na possibilidade de transformação social e no compromisso daquelas e daqueles que nos representam seja no executivo, seja no legislativo. Para continuar falando de jovens, é bem impressionante que, a despeito de todos os importantes avanços no que se refere ao debate de políticas e direitos de juventude, ainda se pense que apenas alguns assuntos (e políticas) digam respeito a eles e a elas.
Desde pelo menos o final da década de 1990, e especialmente a partir de 2005, quando foi criado em nível federal a Secretaria Nacional de Juventude, o Conselho Nacional de Juventude e o Projovem, foram criadas dezenas de estruturas semelhantes nos executivos locais e estaduais. Muitos debates, seminários, campanhas pautaram a juventude seja pelo governo, seja por universidades, ONGs e movimentos sociais. Sem contar nas muitas comissões de juventude ou de políticas de juventude no âmbito da Câmara municipal ou dos legislativos estaduais. No entanto, para muitas pessoas, este foi mais um motivo para "deixar os(as) jovens” no seu devido lugar, como se apenas alguns assuntos (como cultura e esporte, por exemplo) fossem de juventude. Ainda que em outros locais os avanços sejam inegáveis, falta muito para criarmos uma cultura de direitos em nossa sociedade, mais ainda quando os "sujeitos de direitos” em questão são os(as) jovens. O(A) jovem e a ideia de juventude continuam sendo objeto de disputa e em períodos como este as representações a eles associadas e tais disputas tornam-se ainda mais visíveis.
Nessas eleições faz-se, portanto, necessário lembrar mais uma vez que este(a) jovem eleitor(a) – que não é apenas aquele com menos de 18 anos e que pode escolher tirar ou não seu título, mas milhares e milhares de pessoas com até 29 anos pelo Brasil afora – não é um consumidor de cultura (muitas vezes produz cultura também) ou de esporte ou estudante ou trabalhador(a) ou potencial consumidor de drogas ilícitas. O(A) jovem é muitas coisas e, por essa razão, alguns – e eu me coloco entre essas pessoas – pensam o(a) jovem em sua integralidade. Contudo, ao pensar o(a) jovem integralmente a partir da perspectiva dos direitos e considerando diversidades e desigualdades tudo fica mais complexo. E, portanto, mais difícil de realizar. Mas nem sempre simplificar é a solução. Colocar o(a) jovem em uma caixinha só – seja de cultura, seja de educação ou outra qualquer – não fará desse(a) jovem capaz de viver plenamente sua juventude (seja lá como a queira viver porque ser jovem também deveria ser uma questão de oportunidade e escolha).
Pensando em termos de garantia integral de direitos para um sujeito que é complexo, podemos passar a pensar na secretaria, coordenadoria (ou que nome se queira dar) de juventude não apenas como executor de uma política específica para a juventude, ainda que possam ser importantes em algumas tantas realidades, mas com a importante missão estratégica de costurar por dentro do executivo uma ampla articulação entre secretarias que seja capaz de pensar este jovem de forma integral. Esta missão não é nada fácil e exige orçamento, prestígio e pessoas comprometidas (inclusive prefeito(a) e vereadores(as)).
Do lado da sociedade civil, a tarefa não é menos árdua. Cobrar direitos e monitorar políticas de juventude também não se reduz a acompanhar uma pasta, ministério ou secretaria (menos ainda um programa ou ação), mas construir indicadores e olhá-los buscando ver as fragilidades e potencialidades das políticas, ações e programas que deveriam estar pensando o(a) jovem do ponto de vista descrito anteriormente: na sua integralidade e como sujeito de direitos, sem deixar de fora toda a diversidade presente na realidade dos(as) jovens brasileiros.
Nas pesquisas realizadas pelo Ibase e Pólis (em articulação com diversas instituições dentro e fora do Brasil) nos últimos anos sobre juventude, participação e democracia já se apontava um horizonte amplo e complexo no que diz respeito a demandas juvenis. O "Livro das Juventudes Sul-americanas” (2010), por exemplo, enumera nove demandas que perpassaram grupos e sujeitos ouvidos ao longo da investigação. Tais demandas iam das clássicas educação, trabalho e cultura até meio ambiente, segurança, transporte, saúde, moradia e participação. Entre os desafios surgidos a partir de diálogo regional realizado como parte da pesquisa, chamava-se a atenção para o fato das demandas juvenis não poderem estar desconectadas de outros setores da sociedade e dos movimentos sociais. Ou seja, os(as) jovens organizados(as) ali ouvidos queriam mudanças estruturais e lutavam de diferentes maneiras pelo reconhecimento do que seria específico desta geração, pressupondo sua participação nesses processos.
O assunto é longo, mas aqui, e voltando a falar de eleições, é preciso pontuar a ainda necessidade de transformar a visão de candidatos e eleitores(as) sobre os(as) jovens. Continua-se a luta para desconstruir estereótipos que, ainda, associam a juventude (sobretudo negra e pobre) à criminalidade e às drogas ilícitas, por exemplo, mas também construir novas formas de pensar esses(as) jovens. Jovens com diferentes vozes que demandam direitos a partir de realidades distintas, muitas delas marcadas por precariedades e violações cotidianas de direitos. Mas que também inventam diariamente formas criativas de lidar com as adversidades, conectando anseios que perpassam a sociedade a modos atuais, fruto de experiência geracional única, de fazer política, cultura, comunicação, de pensar seu bairro, sua comunidade e o mundo.
Pensando no assunto, o Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro, articulação de organizações que trabalham com juventude no estado e da qual o Ibase faz parte, lançou no último dia 7 de setembro a campanha "Sou jovem e tenho direitos”. A campanha foi inspirada na campanha da Marcha das Vadias do Distrito Federal e traz jovens moradores(as) de diferentes bairros e favelas da cidade levantando cartazes que trazem diferentes demandas da juventude do Rio de Janeiro, lembrando que os(as) jovens representam parte significativa do eleitorado.
A ideia é lembrar jovens eleitores(as) e candidatos(as) (jovens ou não) que as pautas das juventudes são mais amplas e diversificadas e que, para conquistar o voto dos(as) jovens nestas eleições será preciso mais do que promessas, será preciso compromisso com uma transformação social capaz de garantir seus direitos integralmente. Além das fotos que já começaram a circular no Facebook, as organizações que participam do Fórum estão organizando uma série de debates com jovens a partir de seus trabalhos. O Ibase realizará dois deles, um em Campo Grande, no dia 17 de setembro, em parceria com o IFHEP,e outro no Santa Marta, no dia 22 de setembro, com o Grupo Eco.
Por Patrícia Lânes - Doutoranda em Antropologia (PPGA/ UFF).
Fonte: Ibase/Adital.
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